No primeiro ano da tv no Brasil, aquele aparelhinho com “alta” tecnologia chamava a atenção de todos, só que ele ainda era um sonho muito distante. Nessa época, início da década de 1950, um televisor custava 9 mil cruzeiros, uma pequena fortuna naqueles tempos, quase quatro vezes mais do que uma boa vitrola, até então o aparelho que dominava as salas da nossa sociedade.
Em um ano de vida, a tv só podia ser vista por pouco mais de 400 famílias brasileiras, mas fez surgir nos nossos dicionários uma nova palavra: telespectador – a pessoa que assiste a um programa de televisão.
E foi naquele 18 de setembro de 1950, que uma jovem radioatriz pertencente ao elenco das Rádios Tupi e Difusora, ganhou uma das maiores responsabilidades da televisão brasileira: falar ao vivo, sem pestanejar ou gaguejar, de uma vez, todos os prefixos das emissoras associadas, que já eram muitos, e cumprimentar e reverenciar os novos ouvintes, que agora ganhavam um novo termo: telespectadores.
Essa jovem atriz era Yara Lins (1930-2004), que se transformaria em uma das mais premiadas atrizes da nossa TV. Em uma entrevista dada na década de 90 em comemoração aos 45 anos da televisão, Yara declarou: “não era uma palavra, era um palavrão! A gente vinha do rádio onde se lia um script , onde se falava várias vezes ao dia a palavra ouvintes, e de repente eu tinha que falar ao vivo, sem nenhum papel na mão e de forma calma e tranqüila aquela palavra imensa: telespectadores. Eu acho que fiquei quase uma semana para conseguir falar toda a frase sem pestanejar e ficando calma”.
E foi Yara Lins quem surgiu pela primeira vez anunciando que a nova emissora estava no ar: “Senhoras e Senhores Telespectadores, neste momento as Emissoras Associadas do Brasil …..e aí vinham todos o prefixos até chegar na PRG2- Rádio Tupi de São Paulo; PRF3 – Rádio Difusora de São Paulo e PRF3 Tevê, Canal 3, apresentam, neste instante, orgulhosamente, sob o patrocínio de Companhia Antarctica Paulista, Moinho Santista, Organização Francisco Pignatari e Sul América Seguros de Vida e suas subsidiárias, o primeiro programa de televisão brasileiro.”
Segundo a atriz, “eu estava em pânico, mas disse tudo de uma vez, sem gaguejar ou mudar o tom da minha fala em qualquer momento. E não errei nada, nem aquela maldita palavra, telespectadores. Foi ai que eu percebi que tinha na minha memória, uma excelente aliada, que aliás me ajudou a decorar textos e mais textos pelo resto da minha carreira”.
Para muitos daqueles radioatores, acostumados a trabalhar apenas com as tonalidades da voz, já que o texto vinha todo pronto e bastava lê-lo, a televisão representava o grande exercício da memorização, pois a partir daquele momento, era necessário decorar tudo e sempre gravar ao vivo, sem direito a cometer erros.
O primeiro passo estava dado. Com o boa noite as senhoras e aos senhores telespectadores de Yara Lins, não tinha mais volta, a telinha estava definitivamente no ar e invadia as primeiras noites dos brasileiros.